A CRISE NA VENEZUELA E A CONFRONTAÇÃO GEOPOLÍTICA

Como se sabe, a Venezuela tem hoje um governo de facto, do presidente Nicolás Maduro, não reconhecido por grande parte da comunidade internacional, e um presidente autoproclamado, Juan Guaidó, aceito pela maioria dos países das Américas, o Brasil incluído, e por grande parte dos países europeus. Isso em meio a uma crise política, econômica e social gravíssima, com milhares de pessoas fugindo do país, num fluxo migratório inédito na América do Sul. Os venezuelanos convivem ainda com hiperinflação, escassez de alimentos, denúncias de fraudes eleitorais, de censura à imprensa e de uso de força desproporcional pelas tropas do governo contra os manifestantes oposicionistas.

Esta crise pode ser analisada de vários pontos de vista. Há o viés humanitário, decorrente do grave sofrimento imposto à população, em que o acesso aos itens mais básicos de alimentação e aos serviços de saúde, sem contar inúmeros outros aspectos fundamentais para o bom funcionamento de uma sociedade, simplesmente não estão mais disponíveis para os cidadãos. E há o aspecto político, pela confrontação ideológica entre os que ainda defendem o regime chavista de Maduro e os que mostram a falência do modelo político-ideológico que se aplicou por lá. O aspecto econômico também pode ser analisado: como o país chegou ao caos econômico? Que efeitos podem advir das sanções econômicas aplicadas pelos EUA? Enfim, há espaço para discussão nos campos político, econômico, psicossocial e militar.

Este texto abordará o campo da confrontação geopolítica entre as grandes potências – EUA, Rússia e China -, tendo a Venezuela como pano de fundo. Como estão se posicionando? Como isso afeta o desenrolar dos acontecimentos?

Os EUA foram o primeiro país a reconhecer Guaidó como presidente da Venezuela, acusando o governo Maduro de ilegitimidade pelas fraudes eleitorais no processo de reeleição que o reconduziu à presidência. Além da crise humanitária e econômica, aspectos criadores de instabilidade que podem trazer graves consequências para a América do Sul e o Caribe, os EUA veem com preocupação a crescente influência chinesa e russa na área.

Dessa forma, os EUA atuaram com muita firmeza. O presidente Donald Trump declarou que “todas as opções estão sobre a mesa”, afirmação que, obviamente, mostra que não se descartaria uma intervenção militar. Além disso, impôs duras sanções econômicas que afetam diretamente o coração da economia venezuelana: a exportação de petróleo.

A China, por sua vez, há muito advoga que as relações entre os países devem respeitar o princípio da não intervenção. Esse princípio é fundamental para o país, que considera inadmissível a interferência estrangeira em seus próprios problemas, como a questão da Ilha de Taiwan e o separatismo dos uigures na província de Xinjiang.

Além disso, a Venezuela é uma grande parceira comercial e destino de investimentos e empréstimos chineses na América do Sul. Somente entre 2007 e 2012, o Banco de Desenvolvimento da China emprestou a Caracas a impressionante quantia de US$ 42,5 bilhões. Grande parte dos pagamentos desses empréstimos foi feita diretamente em petróleo venezuelano.

Assim, a posição da China, até o momento, é de apoio ao governo Maduro, defendendo uma solução pacífica e interna para o imbróglio político.

Já o presidente russo, Vladimir Putin, e seu primeiro-ministro, Dmitry Medvedev, elevaram o tom da retórica e acusaram os EUA de hipocrisia e de apoiarem um golpe. Medvedev chegou a perguntar como os americanos reagiriam se a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, deputada oposicionista a Trump, se autoproclamasse presidente dos EUA.

A Rússia, que trava uma batalha para manter ou reassumir a influência sobre os países do Leste Europeu, sua área de influência, como as ações na Ucrânia demonstram claramente, dá uma espécie de troco nos EUA ao atuar contra seus interesses na Venezuela. Não se pode descartar que esse tipo de ação possa ser útil como uma espécie de moeda de troca em relação à posição dos EUA em alguma questão no Leste Europeu no futuro.

Os países europeus, inicialmente hesitantes, exigindo que Maduro convocasse novas eleições, após a negativa deste passaram, em sua maioria, a reconhecer Guaidó, liderados por Reino Unido, França, Espanha e Alemanha.

O Brasil, que sofre os efeitos da crise venezuelana ao receber grandes contingentes de refugiados, ficou fortemente contra o governo Maduro, reconhecendo Guaidó como presidente interino. Alinhou-se à posição norte-americana, dispondo-se até a prestar ajuda humanitária, se necessário.

O mundo já assistiu a esse tipo de confrontação. Parece que estamos de volta à guerra fria. Mas a História, que nos dá valiosas pistas sobre o desenrolar futuro dos acontecimentos, não se repete sob as mesmas circunstâncias. Trata-se, desta vez, de uma confrontação num mundo globalizado, com interesses econômicos entrelaçados como nunca antes.

Os militares são o centro de gravidade que mantém Maduro no poder. E a pressão está cada vez maior. No momento em que os comandantes perceberem que o presidente corre o risco de perder o apoio chinês e russo, desembarcarão do governo. Se isso se concretizar de forma que se salvem as aparências de uma “solução interna”, em que não tenha havido “interferência externa nos problemas de uma nação soberana”, China e Rússia poderão alegar que o povo venezuelano encontrou sua saída, apoiando o novo governo. Assim, não se descarte a possibilidade de um “autogolpe” para o qual se encontrará um verniz legal, que “mudaria sem mudar”, mantendo o establishment e tentando reduzir a pressão internacional, com o apoio russo e chinês. Caso isso se confirme, será o prenúncio de nova crise.




TRUMP E A DEFESA DOS EUA

“Em 2024, a China realiza um ataque surpresa, para impedir Taiwan de declarar independência. As forças chinesas desencadeiam ataques aéreos e de mísseis, e realizam desembarques anfíbios na ilha, tornando clara a necessidade de intervenção norte-americana. Infelizmente, os EUA não podem mais intervir a um custo aceitável. As capacidades militares chinesas referentes aos domínios aéreos, marítimos e de superfície continuaram a se desenvolver, enquanto as dos EUA estagnaram. Áreas do oeste do Pacífico se tornaram proibidas para as forças dos EUA. O Pentágono informa ao presidente americano que os EUA podem derrotar a China numa guerra de longa duração, em que toda a capacidade nacional seja mobilizada, com perda de grande número de navios e aeronaves, milhares de vidas e grandes transtornos econômicos – tudo isso sem garantias de que haja um impacto decisivo antes de Taiwan ser invadida. Permitir que Taiwan seja incorporada pela China seria um golpe terrível para a credibilidade norte-americana e para a sua posição na região. Mas impedir que isto aconteça agora exigirá assumir perdas horrendas.”

Da mesma fonte de onde se extrai o texto acima podem ser retiradas outras situações hipotéticas que envolvem desafios ao poderio norte-americano: uma situação de escalada de tensões nucleares envolvendo a Coreia do Norte; uma situação de caos doméstico ocasionada por ações russas contra satélites, cabos interoceânicos de fibra ótica e ataques cibernéticos; a proibição do acesso dos navios comerciais e de guerra dos Estados Unidos ao Mar do Sul da China.

Nenhuma dessas situações foi retirada de livros de ficção. Elas foram extraídas de relatório elaborado pela Comissão da Estratégia Nacional de Defesa. Trata-se de um painel suprapartidário instituído pelo Congresso dos EUA com a missão de avaliar a Estratégia de Defesa desse país e de fazer as sugestões que julgasse adequadas. Os especialistas da comissão encerraram seu trabalho em novembro de 2018.

A comissão, em seu relatório – disponível na internet -, concorda com as conclusões da Estratégia de Defesa Norte-Americana, publicada também em 2018 e sobre a qual tratei neste espaço em 18 de abril do ano passado. Ambos inferem que a competição estratégica entre estados nacionais, e não a chamada guerra ao terror, é a primeira prioridade da segurança nacional dos EUA.

E como se pode claramente aduzir da situação hipotética do ataque chinês a Taiwan, os estrategistas e consultores, tanto do Congresso quanto do Pentágono, concordam que a superioridade da capacidade militar norte-americana em relação a seus possíveis adversários, especialmente a China, vem sendo reduzida ano a ano.

Dentro desse cenário, destaca-se a preocupação com a disponibilidade orçamentária. Os especialistas alertam para o fato de que em 1996, para cada dólar gasto por Rússia e China em pesquisa e desenvolvimento científico, os EUA gastavam US$ 8,21. Vinte anos mais tarde os gastos dos EUA na mesma área superam os de seus adversários em apenas seis centavos.

Ao mesmo tempo, a China sob a liderança de Xi Jinping adota uma postura cada vez mais incisiva em relação a Taiwan. No início deste ano Jinping reafirmou que a “China deve ser – e será – reunificada”. Dirigindo-se ao Comitê Central Militar do Partido Comunista, instância máxima das Forças Armadas do país, ele alertou que “o mundo está passando por uma era de mudanças drásticas” e que “riscos previsíveis e imprevisíveis” estavam aumentando.

Por outro lado, Tsai Ing-wen, presidente de facto de Taiwan, repetidas vezes tem conclamado a comunidade internacional a reafirmar “os valores de democracia e liberdade, com a finalidade de conter a China e minimizar a expansão de sua influência hegemônica.”

O presidente Donald Trump, por sua vez, emite sinais contraditórios. Ao mesmo tempo que reforça o orçamento de defesa e endurece a posição comercial dos EUA, travando uma verdadeira batalha no campo econômico contra a China, anuncia a retirada das forças norte-americanas da Síria, ação que enfraquece a posição dos EUA no Oriente Médio, área de enorme importância estratégica. O gesto causou o imediato pedido de demissão de Jim Mattis, respeitadíssimo general fuzileiro naval que era secretário de Defesa e assinou a Estratégia de Defesa de 2018. Não havia forma mais clara de Mattis demonstrar a sua insatisfação.

Confirmando-se a saída dos EUA da Síria, abre-se um vácuo que será necessariamente preenchido. Irã e Rússia, países citados como adversários estratégicos nos documentos de defesa, ganham espaço e os alertas feitos pela Comissão da Estratégia Nacional de Defesa tornam-se mais evidentes, com o enfraquecimento ainda maior das posições relativas dos EUA em mais uma área de importância vital para seus interesses estratégicos.

Mattis não foi o primeiro militar a sair do governo Trump por discordância na condução dos rumos estratégicos da defesa. Em março do ano passado, apenas um ano após sua nomeação como assessor de segurança nacional, outro militar respeitadíssimo, o general H. R. McMaster foi demitido. Assim como Mattis, McMaster dificilmente teria concordado com a retirada das tropas norte-americanas da Síria neste momento.

Alguns analistas internacionais têm definido a política externa de Trump, especialmente em assuntos de defesa, como “errática e cambiante”. Ao mesmo tempo que aprovou a nova Estratégia de Defesa, indicando a necessidade de maior assertividade e alertando para o crescente enfraquecimento da posição estratégica de seu país em várias regiões de interesse vital, Trump toma decisões que vão exatamente na contramão do que seria esperado para a efetivação daquela estratégia. Os aliados e rivais dos EUA acompanham, entre surpresos e incrédulos, para onde caminhará a maior potência militar do planeta.




O DRAMA DOS REFUGIADOS

A crise política e econômica na Venezuela já provocou, segundo dados da Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), desde 2015, a fuga de cerca de 3 milhões de cidadãos. Atualmente, estima-se que cerca de 5 mil pessoas deixem o país a cada dia.

O principal destino dos venezuelanos é a Colômbia, que já recebeu cerca de 1 milhão de pessoas. Para o Peru já foram cerca de 500 mil. Equador, Chile, Argentina e Panamá também são destinos bastante procurados, bem como o Brasil.

Aliás, os reflexos imediatos da crise para o Brasil já se fazem sentir há mais de um ano. Em 16 de junho do ano passado este jornal publicava editorial alertando para a gravidade do problema. Atualmente, segundo dados do governo federal, mais de 54 mil venezuelanos já solicitaram refúgio no Brasil. Outros 18 mil solicitaram residência temporária e 12 mil haviam agendado atendimento na Polícia Federal até setembro.

O Brasil começa a lidar com uma situação que não é novidade no planeta. Estima-se que existam hoje mais de 25 milhões de refugiados em todo o mundo. A Europa convive com as tristes cenas de barcos à deriva, com centenas de pessoas amontoadas tentando cruzar o Mediterrâneo, vindas do Norte da África. Hoje, na Turquia há quase 3 milhões de refugiados sírios. Em 2016 o Paquistão recebeu cerca de 1,4 milhão de refugiados afegãos. Uganda abriga quase 1 milhão de refugiados do Sudão do Sul.

Enquanto isso, a coluna de cerca de 5 mil migrantes, em sua maioria hondurenhos, que cruza o México com destino à fronteira com os EUA foi tema importante das recentes discussões eleitorais naquele país. O presidente Trump assinou decreto proibindo por 90 dias que imigrantes ilegais solicitem refúgio e determinou o deslocamento de militares do Exército para a fronteira, mostrando-se firme na decisão de impedir a entrada da massa de migrantes.

O problema dos refugiados alcança proporções alarmantes. Mas estamos falando de refugiados ou de migrantes? Ao tratar desse assunto, é muito importante que a distinção entre essas duas categorias fique clara. Migrante é a pessoa que muda seu lugar de residência por tempo indeterminado. Essas pessoas estão sujeitas às normas e políticas migratórias de cada nação, que permitem ou não a entrada e permanência no país. Segundo a Organização Internacional para Migração, organismo da ONU que trata do tema, existiam em 2015 cerca de 243 milhões de migrantes internacionais no mundo, ou seja, uma em cada 30 pessoas vivia num país diferente de onde nasceu.

Se os migrantes estão sujeitos às normas de cada país para terem seu acesso pela fronteira aceito, os refugiados contam com situação diferente. Estes são “pessoas que estão fora de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição relacionados a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política, como também devido a grave e generalizada violação de direitos humanos e conflitos armados”. E por esse status, de acordo com a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951, da qual o Brasil e a maior parte dos países do mundo são signatários, “nenhum país expulsará ou rechaçará, de maneira nenhuma, um refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas”.

Assim, fica claro que o tratamento a ser dado a um refugiado é completamente diferente daquele a ser dispensado a um migrante. No Brasil, de acordo com o Estatuto do Refugiado, lei promulgada em 1997, qualquer estrangeiro que chegue ao País, mesmo irregularmente, e se apresente a uma autoridade migratória na fronteira expressando sua vontade de ser reconhecido como refugiado não poderá ser deportado até que lhe seja concedido ou não o refúgio. Caso o migrante não expresse essa condição, será tratado normalmente e de acordo com as normas migratórias.

Os milhares de venezuelanos que chegam ao Brasil vêm causando grande impacto econômico e social ao Estado de Roraima – problemas na rede hospitalar, aumento da violência urbana e impacto na oferta de empregos, entre muitos outros problemas. O governo local, pressionado, cobrou do governo federal a ampliação da ajuda econômica e chegou a solicitar ao Supremo Tribunal Federal o fechamento temporário da fronteira. Como se viu acima, tal decisão seria polêmica, em razão do status de refugiados que os venezuelanos almejam alcançar, o que impediria o seu rechaço na fronteira. Por outro lado, o Ministério da Defesa determinou o estabelecimento da Operação Acolhida, de modo que as Forças Armadas, num ambiente interagências, dessem uma resposta mais eficiente às demandas de toda ordem que surgem em razão desse enorme afluxo de pessoas.

Outro aspecto a ser considerado é que a crise humanitária sem precedentes na América do Sul poderá causar tensões ainda maiores entre a Venezuela e os seus vizinhos sul-americanos, em especial a Colômbia, país mais fortemente afetado por ser o principal destino dos venezuelanos. Qualquer tensão entre vizinhos afetaria o Brasil, que por sua importância no subcontinente não se poderia manter indiferente.

A Organização dos Estados Americanos (OEA), por ser o foro por excelência para tratar dos assuntos de segurança hemisférica, deveria patrocinar os maiores esforços na busca de soluções para a crise migratória venezuelana. Nesse sentido foi criado um grupo de trabalho para estudar o problema (www.oas.org/legal/spanish/gensec/EXOR1803.pdf). Espera-se que, ao final dos trabalhos, o grupo chegue a recomendações que mitiguem o sofrimento dos venezuelanos que deixaram sua pátria e, ao mesmo tempo, auxiliem os governos sul-americanos a encontrar as melhores soluções para lidar com a situação.




O SUBMARINO RIACHUELO

No próximo dia 14, a Marinha do Brasil lança ao mar o “Riachuelo”, primeiro submarino de sua classe fabricado no Brasil. O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), uma parceria estratégica entre o Brasil e a França, prevê, além dele, a construção de mais 3 submarinos convencionais e um de propulsão nuclear.

Trata-se de uma grande vitória e de um momento histórico. Quase uma década após o marco inicial da construção, finalmente o S-40 Riachuelo vai navegar.

A Política Nacional de Defesa (PND) e a Estratégia Nacional de Defesa (END) são os documentos norteadores da política e da estratégia de defesa nacionais. Regulam, dentre muitas outras coisas, quais são os Objetivos Nacionais de Defesa do Brasil e como estes serão alcançados. Para alcançar o objetivo de “garantir a soberania, o patrimônio nacional e a integridade territorial”, dentre uma série de outras ações, a Marinha do Brasil tem a incumbência de garantir a tarefa estratégica de “negar o uso do mar a qualquer concentração de forças inimigas que se aproxime do Brasil por via marítima”.

O mar é fundamental para o Brasil. São mais de 8 mil Km de costa. Mais da metade da população vive em cidades situadas em até 60 Km do litoral. Aproximadamente 95% de nossas importações e exportações são feitas por via marítima. Mais do que isso, cerca de 90% do petróleo produzido no país, bem como a maior parte do gás natural, vem do mar. A riquíssima biodiversidade, o enorme potencial pesqueiro, as possibilidades da navegação de cabotagem e o turismo marítimo são outros aspectos que podem ser citados.

A Marinha, para chamar atenção para o tamanho e potencialidades do nosso mar, cunhou a expressão “Amazônia Azul”. A intenção da analogia com a Amazônia é demonstrar que a área marítima sob responsabilidade brasileira, somatório do mar territorial, zona econômica exclusiva e plataforma continental, chega a 4,5 milhões Km2, área comparável em extensão e biodiversidade à Amazônia propriamente dita. Ter jurisdição sobre uma área tão grande é uma pesada responsabilidade. A defesa de riquezas tão importantes não pode ser relegada.
Além da chamada Amazônia Azul, é importante considerar a relevância estratégica do Atlântico Sul. Desde 1986, a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), congrega 24 países da América do Sul e da África banhados pelo Atlântico Sul. O Brasil, como signatário, assumiu compromissos com a manutenção da paz, da estabilidade e do desenvolvimento sustentável da região, além de também comprometer-se com a conservação do meio ambiente marinho.

O submarino é a arma por excelência para a negação do uso do mar por sua capacidade de se ocultar e surpreender possíveis invasores. Logo, é a arma ideal para dissuadir a presença de qualquer ameaça à Amazônia Azul ou a de qualquer ator que possa causar a desestabilização do Atlântico Sul.

O Riachuelo, submarino da classe Scorpène, tem mais autonomia, pode ficar mais tempo submerso e é mais silencioso que os demais submarinos atualmente em operação na Marinha do Brasil. Constitui-se, portanto, em um relevante ganho operativo para a Força de Submarinos da Esquadra. Por ser um submarino convencional, com propulsão diesel elétrica, precisa subir próximo à superfície para aspirar ar atmosférico em determinados intervalos de tempo, para renovar o ar ambiente e permitir o funcionamento dos motores.

Um submarino de propulsão nuclear, por sua vez, tem seu tempo sob a água limitado não por necessidades técnicas relacionadas à sua propulsão, mas sim pela capacidade de transportar os suprimentos e pela própria capacidade da tripulação de permanecer submersa. Assim, sua capacidade de deslocar-se de modo furtivo por longas distâncias e de surpreender possíveis invasores é muitas vezes aumentada.

A produção dos submarinos convencionais e do submarino nuclear previstos no PROSUB dá-se segundo um modelo conhecido como tríplice-hélice: governo, indústria e academia impulsionam de forma sinérgica o programa, gerando inovação. A Marinha, em cumprimento ao previsto na PND e na END e apoiada por uma política de Estado que se caracteriza por prolongar-se no tempo e estender-se por diferentes governos, definiu as necessidades, celebrou os acordos com a França, inclusive os de transferência de tecnologia, fechou os contratos e executa o programa. A Indústria Nacional produz de forma inovadora, apropriando-se de novas tecnologias, gerando renda e empregos. As universidades e institutos de tecnologia civis e militares fazem pesquisas aplicadas às necessidades do programa, geram novos conhecimentos, formam e aperfeiçoam recursos humanos.

A capacidade de projetar e de fabricar submarinos nucleares está hoje restrita a um rol muito pequeno de países. Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e China. Ao perseguir incansavelmente este objetivo, desde a década de 1970, a Marinha do Brasil dá provas de determinação e resiliência. O lançamento do Riachuelo é um passo importante e fundamental, que dá novo ânimo aos que perseguem incansavelmente este objetivo.

Que seja também uma oportunidade para a sociedade brasileira refletir sobre a importância do mar e de sua exploração econômica sustentável, levando em consideração a preservação do ecossistema marítimo. Que também se perceba o valor do desenvolvimento científico/tecnológico e industrial obtido no processo de aquisição de tecnologia e de construção do submarino. Mais ainda, que se consolide o entendimento por parte de toda a sociedade da relevância da manutenção do fluxo de recursos necessários para programas como o PROSUB. Afinal, esses programas estratégicos das Forças Armadas provêm segurança e defesa, desenvolvem tecnologias, produzem riquezas e colaboram sobremaneira para o desenvolvimento econômico e social do país.




ECOS DA GUERRA DO PACÍFICO

No último dia 1º de outubro, a Corte Internacional de Justiça de Haia, principal órgão judiciário da Organização das Nações Unidas, decidiu contrariamente à Bolívia, que havia levado àquele tribunal, no ano de 2013, uma solicitação no sentido de que o Chile fosse obrigado a negociar com a Bolívia uma solução para que esta voltasse a ter uma saída soberana para o mar. A decisão pode ser encontrada na página eletrônica do Tribunal, no endereço https://www.icj-cij.org/files/case-related/153/153-20181001-JUD-01-00-EN.pdf .

A decisão evidentemente repercutiu bastante na Bolívia. A Constituição daquele país, em seu artigo 267, estabelece que “o Estado boliviano declara seu direito irrenunciável e imprescritível sobre o território que lhe dê acesso ao Oceano Pacífico e seu espaço marítimo. A solução efetiva do desentendimento marítimo através de meios pacíficos e o exercício pleno da soberania sobre o dito território constituem objetivos permanentes e irrenunciáveis do Estado boliviano”. A decisão é também um revés político para o Presidente Evo Morales, que mantém a aspiração de alcançar a saída para o mar como um dos principais objetivos de sua política exterior.

Para entender o problema, é importante relembrar sua origem. Chile e Bolívia tornaram-se independentes da Espanha em 1818 e 1825, respectivamente. À época, a Bolívia possuía uma costa de aproximadamente 400 km junto ao Oceano Pacífico, na Região de Antofagasta. Em 1866 e 1874, os dois países estabeleceram tratados de limites que confirmaram a saída boliviana para o mar.

Em 05 de abril de 1879, o Chile declarou uma guerra à Bolívia e ao Peru, que ficou conhecida como Guerra do Pacífico.  A causa imediata do conflito foi o aumento dos impostos cobrados pelo governo boliviano das empresas chilenas que exploravam o salitre na região. Pelo entendimento do governo chileno, esse aumento contrariava uma das cláusulas do tratado de limites de 1874. O Peru foi envolvido na guerra em razão de um acordo que havia firmado com a Bolívia, comprometendo ambos os países a se apoiarem mutuamente em caso de guerra contra o Chile.

Ao final da guerra, em 1884, o Chile havia conquistado a região costeira boliviana, bem como a região peruana de Tarapacá. Em outubro de 1904, Chile e Bolívia celebraram um acordo definitivo de paz. Por esse acordo, os territórios ocupados pelo Chile durante a guerra seriam reconhecidos como chilenos “absoluta e perpetuamente”. As fronteiras entre os dois países foram demarcadas e o Chile se comprometeu a construir uma estrada de ferro ligando El Alto, no platô andino boliviano, ao porto de Arica. Essa estrada foi construída, sendo inaugurada em 1913. Além disso, o Chile garantiu à Bolívia o direito de estabelecer agências aduaneiras nos portos de Arica e Antofagasta, tendo “amplo e gratuito” direito de trânsito comercial.Apesar do acordo, em 1919 a Bolívia apresentou ao Chile seu pleito de reaver o território costeiro, independentemente do que havia sido estabelecido no tratado de paz de 1904. Desde então, tal pleito foi renovado inúmeras vezes, até os dias de hoje.

Outro fato relevante aconteceu em 1929, quando Chile e Peru celebraram um acordo, no qual os dois países se comprometeram a não ceder qualquer território a um terceiro país sem o prévio consentimento da outra parte. Este pacto acabou sendo determinante em 1975, quando o Chile e a Bolívia quase chegaram a um acordo, que foi desfeito pela não aceitação dos termos pelo Peru.

Assim, o revés boliviano determinado recentemente pela decisão do Tribunal de Haia é mais um que se soma a uma grande série de derrotas diplomáticas, desde 1919. Mas de forma nenhuma terá o condão de encerrar o assunto ou diminuir o ímpeto boliviano de alcançar aquele que é um dos objetivos nacionais permanentes, expresso em sua Constituição.

Há aspectos comerciais e econômicos envolvidos. A Bolívia, como país mediterrâneo, sempre dependerá dos países vizinhos para estabelecer seu comércio internacional. Altos custos de transportes, infraestrutura inadequada, dificuldades burocráticas no estabelecimento de negociações comerciais que envolvam terceiros países, tudo isto constitui gargalos que impedem que o país participe com mais efetividade do comércio internacional, dificultando seu crescimento econômico.

Há também o aspecto do orgulho nacional, ferido pela perda do território, que alimenta o desejo praticamente unânime na população boliviana de reaver o acesso ao mar. E este aspecto, que sempre foi relevante, torna-se ainda mais importante nos dias atuais de instantaneidade na comunicação. Nas mídias sociais bolivianas, o assunto, aglutinado em hashtags como as #MarParaBolivia e #MarParaLosPueblos atingiram milhares de postagens nos dias seguintes à decisão da Corte de Haia, galvanizando a opinião pública.

A decisão da Corte Internacional de Justiça, embora não obrigue o Chile a negociar, lembra que as partes não estão impedidas de continuar os diálogos e intercâmbios, que remontam à década de 1920, na busca de uma solução para a questão.

O caso nos alerta para as questões geopolíticas sul-americanas, no entorno imediato do Brasil. A busca boliviana por recuperar uma saída para o mar, perdida em uma guerra do século 19, é a reafirmação da importância que se deve dar ao estudo de tais questões, em especial as que afetam um país com o qual temos quase 3500 km de fronteira. O General Carlos de Meira Mattos, autor de vasta obra que merece ser mais bem conhecida pelos brasileiros, define em seu livro “Geopolítica e Modernidade”, que a geopolítica é a “aplicação da política aos espaços geográficos, sob a inspiração da história”. Parece uma definição feita sob medida para o caso: um espaço geográfico antes boliviano e agora chileno, no qual se travou uma guerra e que, há cem anos, é objeto de disputa diplomática.




TAMBORES DA GUERRA?

A Rússia acaba de encerrar a Operação Vostok 2018. Tratou-se certamente do maior exercício militar russo desde o fim da guerra fria. Talvez tenha sido o maior da História. O Ministério da Defesa daquele país divulgou que cerca de 300 mil militares participaram, utilizando mil aeronaves, 80 navios e 36 mil veículos. Tropas da China e da Mongólia também estavam presentes. Embora seja muito provável que esse número esteja consideravelmente inflado, a operação não deixa de ser impressionante. A título de comparação, as manobras do ano passado, chamadas Zapad 2017 e realizadas no Leste Europeu, envolveram, em números oficiais, 12.700 militares.

Manobras militares têm muitas finalidades. Do ponto de vista tático/operacional, servem como excelente ferramenta de treinamento, permitindo a imitação do combate e o emprego conjunto das forças de terra, ar e mar, além da prática dos sistemas de armas, dos sistemas de comando e controle, de cibernética, e de uma infinidade de outros aspectos da guerra. Do ponto de vista logístico, que parece ter sido um dos mais relevantes neste caso, é uma excelente oportunidade de verificar e testar as linhas de transporte, permitir a chamada “aproximação dos meios”, o deslocamento de tropas e de todo o apoio logístico desde suas bases até o teatro de operações – onde as operações militares são realizadas. Não esqueçamos que essa é uma tarefa especialmente complexa quando se trata da Rússia, país de dimensões continentais, que se estende por toda a Eurásia, das fronteiras com os países europeus até o Estreito de Bering e o Oceano Pacífico, no extremo oriental asiático.

Mas além desses aspectos eminentemente militares há os aspectos estratégicos e geopolíticos, talvez ainda mais relevantes. A dissuasão é uma antiga e importante estratégia de segurança. Por meio dela um país demonstra possuir poder militar suficiente e apto a ser empregado de imediato, capaz de se contrapor a qualquer ameaça. Nessa direção, a realização do Vostok 2018 faz todo o sentido: uma grande demonstração de força destinada a impressionar e dissuadir potenciais adversários.

Há também a participação da China. Divulgou-se que o Exército Popular de Libertação enviou ao Teatro de Operações 3.200 militares, cerca de mil veículos e 30 aeronaves. O emprego das tropas de forma combinada com a Rússia já havia sido utilizado em manobras no âmbito da Organização de Cooperação de Xangai (Shangai Cooperation Organization). Entretanto, aqueles exercícios usavam como cenário operações contra ameaças não tradicionais – terrorismo, catástrofes naturais e ilícitos transnacionais, por exemplo. Agora, pela primeira vez desde a década de 1960, os exércitos dos dois países operam juntos num cenário de guerra de alta intensidade. Esse tipo de treinamento é muito importante para a China. Operar com outro exército não é tarefa fácil. Conciliar diferentes doutrinas, técnicas, táticas, procedimentos, equipamentos, mentalidades, tudo isso enfrentando a barreira de um idioma completamente diferente, é complexo e exige muita prática.

Do ponto de vista geopolítico, as manobras enviam um recado aos Estados Unidos e seus aliados da Otan: China e Rússia são capazes de atuar em conjunto num cenário de guerra de alta intensidade e de amplo espectro. E essa capacidade é demonstrada exatamente neste momento de conflito comercial nas relações sino-americanas e de tensões políticas entre Rússia e EUA em razão das acusações de interferência nas eleições norte-americanas e pelas posições antagônicas assumidas por cada uma das potências na Síria e no Leste Europeu.

A China, além do mais, tenta demonstrar que é capaz de operar fora de seu território. Mas não só isso. Ao mesmo tempo que tenta impressionar os russos enviando tropas de elite, resultado de um processo de crescente modernização de suas Forças Armadas, os chineses têm a rara oportunidade de operar com um exército formado por soldados experimentados em combate. As lições aprendidas pelos comandantes russos nas guerras da Síria e da Ucrânia certamente serão de algum modo transmitidas aos inexperientes comandantes chineses.

Todo o cenário aponta para uma preocupação crescente dos estrategistas militares com a possibilidade de eclosão de um conflito de largas proporções envolvendo as grandes potências. Tratei desse assunto neste espaço, em 18 de abril, quando escrevi sobre a nova Estratégia de Defesa dos EUA, que reorienta a preparação de suas Forças Armadas na direção da preparação para conflitos de alta intensidade, ao invés da chamada guerra ao terror.

O analista militar russo Pavel Felgenhauer, citado pela versão eletrônica do jornal japonês The Japan Times em reportagem de 10 deste mês, diz que o Vostok 2018 “não é apenas sobre mandar um sinal, ou uma mensagem, mas a preparação para uma guerra real de grande magnitude”. O analista russo declara ainda que “o Estado-Maior russo acredita que uma guerra mundial acontecerá depois de 2020, ou em uma guerra global, ou em uma série de conflitos de magnitude”.

Não se trata de anunciar o fim do mundo, ou de afirmar que a humanidade caminha de forma inexorável para uma guerra de grandes proporções. As relações internacionais são sujeitas a um enorme número de variáveis e guerras sempre podem ser evitadas. Quase ao mesmo tempo que os tambores da guerra tocavam no Vostok 2018, perto dali, na Península da Coreia, os presidentes das Coreias do Norte e do Sul se encontravam, em mais um passo em favor da paz e na direção do encerramento formal da Guerra da Coreia.

Fazendo votos de que a paz sempre encontre o caminho, fica o alerta para que os espectadores, como nós aqui, do outro lado do mundo, não deixemos de estar atentos a eventos que certamente trarão consequências para o Brasil e para os brasileiros.




UM MUNDO MULTIPOLAR

O general fuzileiro naval James Mattis, secretário de Defesa dos Estados Unidos, esteve em visita à Escola Superior de Guerra, no Rio de Janeiro, em 14 de agosto. Foi apenas uma das escalas do militar da reserva em sua viagem à América do Sul, que também incluiu a Argentina, o Chile e a Colômbia. Em sua palestra para os alunos do Curso de Altos Estudos, Política e Estratégia (Caepe), o experiente soldado, comandante de tropas nas guerras do Iraque e do Afeganistão, destacou que selecionara três prioridades no desempenho de sua função, equivalente à de Ministro da Defesa na estrutura brasileira.

A primeira prioridade seria aumentar a letalidade dos militares americanos, de modo a aumentar também a dissuasão em face de possíveis agressores. A segunda seria ampliar e fortalecer o relacionamento das Forças Armadas norte-americanas com as forças dos países aliados. E a terceira prioridade, melhorar as práticas gerenciais e o trato com o dinheiro público no âmbito do Departamento de Defesa.

Neste artigo, vou me ater às duas primeiras prioridades citadas. A primeira alinha-se perfeitamente com o movimento feito pelos EUA no sentido de redirecionar sua estratégia de defesa e reestruturar suas Forças Armadas. Após um período em que se dedicou quase que exclusivamente à guerra assimétrica, enfrentando oponentes que de forma alguma poderiam contrapor-se ao poderio econômico, bélico e industrial norte-americano, os EUA agora reconhecem que, na atual realidade de distribuição multipolar do poder, podem ser desafiados por oponentes com capacidade militar equivalente ou mesmo, em alguns aspectos, superior. Estamos falando da Rússia e da China.

Para fazer face a esse desafio os EUA reestruturam suas Forças Armadas. Recentemente foi criado um Comando para o Exército do Futuro, focado no desenvolvimento de novas capacidades e na adoção de novas tecnologias para o Exército. Isso para não falar na anunciada e ainda não muito clara criação da chamada Força Espacial, que seria mais uma força armada norte-americana.

Quando falou da segunda prioridade, o general Mattis deixou clara a finalidade de sua visita. Estava tratando justamente de tentar “ampliar e fortalecer o relacionamento com os países aliados”. Fez referência a um valor caríssimo aos militares de todo o mundo: a camaradagem e a amizade forjada nos campos de batalha. Citou o fato histórico da aliança que uniu brasileiros e americanos nos campos de batalha da Itália durante a 2.ª Guerra Mundial e lembrou o fato de sermos, Brasil e Estados Unidos, as duas maiores democracias do Ocidente. Elogiou a Escola Superior de Guerra e lembrou a presença constante de estudantes americanos na instituição.

Falou ainda sobre o que entende ser o objetivo de nações que têm “valores comuns” e “interesses compartilhados”: a construção de um hemisfério que seja uma “ilha de democracia e prosperidade num mundo instável”. A transcrição do discurso do general Mattis pode ser encontrada no site da ESG.

O movimento da diplomacia militar norte-americana em direção aos principais países sul-americanos coincidiu com um fato diplomático significativo. Como se sabe, a China considera Taiwan uma província rebelde e não aceita que os países mantenham relacionamento diplomático com o governo da ilha. Fazer essa escolha implica necessariamente abrir mão de ter relações diplomáticas com a China.

Pois bem, praticamente ao mesmo tempo que Mattis visitava a América do Sul, na América Central, El Salvador, que mantinha relacionamento diplomático com Taiwan, mudou de posição e passou a reconhecer a República Popular da China. Atualmente, apenas 16 países no mundo, além do Vaticano, ainda optam por se relacionar com Taiwan, ao invés da China, a grande maioria da América Central e do Caribe – Belize, Guatemala, Haiti, Honduras, Nicarágua, Santa Lúcia e São Vicente e Granadinas são exemplos. O movimento de El Salvador foi feito pouco tempo depois de o Panamá e a República Dominicana terem feito o mesmo. É desnecessário salientar quão significativo do ponto de vista geopolítico é a balança mudar de lado justamente nesses países localizados geograficamente tão perto dos EUA.

O aumento da influência econômica chinesa nas Américas do Sul e Central é evidente. As trocas comerciais entre o gigante asiático e a América Latina e o Caribe chegaram a US$ 244 bilhões ano passado, duas vezes mais que uma década antes, de acordo com o Global Development Policy Center, da Boston University. Desde 2015 a China é o principal parceiro comercial da América do Sul. As vendas de equipamentos militares também são crescentes. Destaca-se a Venezuela, mas várias outras nações das América do Sul e Central e do Caribe têm adquirido diversos tipos de materiais de defesa dos chineses.

Isso ao mesmo tempo que do outro lado do mundo a “Nova Rota da Seda” (Belt and Road Initiative, na tradução chinesa para o inglês), a principal ação de relações exteriores do governo Xi Jinping, ganha impulso. Trata-se de uma iniciativa que visa a fortalecer os laços econômicos com os países da Ásia, África e Europa, o que poderia, em tese, criar uma dependência econômica que alinharia esses países à China e aos seus interesses geopolíticos.

O mundo vive uma era de crescentes riscos para a segurança e nós deveríamos estar atentos aos “tombos dos dados” que podem afetar-nos como país, conforme bem destacou o professor Celso Lafer em artigo neste espaço, em 19 de agosto. E como ele lembrou, citando Hanna Arendt, “somos do mundo, e não apenas estamos no mundo”.

As disputas geopolíticas estão sendo travadas à luz do dia e nos afetam. O Brasil, por seu tamanho, sua importância, sua História e seu destino, não pode ficar a reboque dos acontecimentos.




O ENCONTRO DE CÚPULA DE HELSINQUE

Um dia após premiar os franceses, campeões da Copa da Rússia, perante uma audiência global de mais de 1 bilhão de pessoas, Vladimir Putin viajou a Helsinque, capital da Finlândia, para encontrar-se com o presidente dos EUA, Donald Trump.

O encontro ocorreu após uma intensa movimentação diplomática de ambos os presidentes. Putin vinha de encontrar-se na semana anterior com Ali Akbar Velayati, ex-ministro das Relações Exteriores do Irã, homem de confiança e conselheiro do presidente Ali Khamenei. Antes disso, em 11 de julho, reunira-se com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. A guerra civil na Síria certamente esteve na pauta das conversas.

Trump encerrou com o encontro de Helsinque uma atribulada viagem à Europa, que se iniciou em Bruxelas, com a reunião dos países-membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Foi um encontro tenso, no qual Trump exigiu que países-membros da aliança militar aumentassem seus gastos com defesa. Ao mesmo tempo, criticou fortemente a Alemanha por, no seu entender, depender excessivamente do fornecimento de gás natural russo. De Bruxelas, seguiu para Londres, para encontrar-se com a primeira-ministra Thereza May. Lá, concedeu uma entrevista em que criticou May pela forma como está conduzindo a saída do Reino Unido da União Europeia. Trump ainda encontrou tempo para chocar os líderes europeus declarando que a União Europeia seria “inimiga comercial” dos EUA.

A semana que antecedeu a reunião de Helsinque contextualiza o encontro e mostra como é o momento dos dois presidentes. Putin vive fase de grande visibilidade, surfando a onda positiva de ter sido o anfitrião de uma Copa do Mundo. Trump, bastante criticado no seu país e na Europa, acusado de tratar melhor os russos, inimigos históricos, do que os próprios aliados europeus. Como se não bastasse, no dia do encontro uma sequência inacreditável de publicações no Twitter expôs Trump a uma onda de críticas ainda maior. Ele escreveu que o relacionamento entre os EUA e a Rússia nunca tinha estado tão ruim quanto atualmente graças a muitos anos de “tolices e estupidez” dos próprios EUA. Imediatamente depois, a conta oficial do Ministério das Relações Exteriores russo respondeu simplesmente: “Nós concordamos”. Talvez seja um caso único na história em que um presidente publicamente e algumas horas antes de se encontrar com o maior adversário reconhece que os problemas que existem entre seus países são de sua própria culpa.

Os problemas a que o presidente Trump se refere e que colocaram as relações entre Rússia e EUA num nível alto de tensão são variados e complexos. Há a questão da interferência dos russos, acusados de atuar por meio de ações de guerra cibernética nas eleições americanas de 2016. Há, também, a guerra civil na Síria, com toda a sua complexidade, que opõe nos campos de batalha sírios coalizões lideradas, de um lado, pelos EUA e, de outro, pelos russos. Outro ponto de grande sensibilidade são a anexação da Crimeia e a ação militar russa (encoberta, mas nem tanto) na Ucrânia, que é a causa das sanções econômicas impostas à Rússia pelos EUA e por seus aliados.

Como se vê, assuntos a serem resolvidos – ou pelo menos que merecessem alguma tentativa de encaminhamento de soluções futuras – não faltavam. Entretanto, na entrevista coletiva concedida ao término da reunião, Trump focou suas respostas na política interna, preocupado em tentar demonstrar que os russos não interferiram nas eleições que o conduziram ao poder. Afinal, admitir tal interferência, tida como certa pelas próprias autoridades das agências de inteligência norte-americanas, seria de alguma forma admitir uma sombra de ilegitimidade no processo eleitoral que o conduziu à presidência. Para isso, disse que Putin negara peremptoriamente tais ações e que ele não tinha nenhum motivo para desconfiar de que isso não fosse verdade. Evidentemente, Putin disse o mesmo. Quanto à crise da Ucrânia/Crimeia, nenhuma novidade. Quanto à Síria, a reafirmação de que ambos os países estão combatendo os terroristas. Ou seja, quanto aos assuntos que realmente importam do ponto de vista geopolítico, nada de relevante.

Ou quase nada. Putin e Trump afirmaram que a era de desconfianças da guerra fria não deveria existir mais, que o mundo hoje mudou e que não deveria haver razão para tensões entre Rússia e EUA.

Essa afirmação não encontra amparo na realidade e é negada pelos próprios documentos de nível político/estratégico de ambos os países. A Estratégia Nacional de Defesa dos EUA, documento de janeiro deste ano, portanto da administração Trump, identifica que os EUA enfrentam uma era em que a competição estratégica entre os Estados é a maior ameaça à segurança e cita a Rússia como um país que viola fronteiras e pressiona diplomática e economicamente seus vizinhos.

Já os russos, em sua Estratégia de Segurança Nacional, publicada em 31 de dezembro de 2015, citam que os EUA e aliados, a fim de manter a atual dominância sobre os assuntos internacionais, adotam uma “política de contenção” que se opõe à implementação de uma política externa russa independente. Expressa, ainda, que a Otan atua em violação às normas do Direito Internacional, expandindo as atividades militares em direção às fronteiras da Rússia, sendo uma ameaça à segurança daquele país.

Ou seja, o discurso de Trump foi focado em seus problemas internos e não levou em consideração os graves desafios geopolíticos identificados nos documentos produzidos por sua própria administração. Já Putin, para aproveitar a metáfora futebolística, entrou em campo e nem precisou se defender. O adversário cedeu o terreno e ele jogou solto, fez embaixadinhas para a torcida e correu para o abraço. A torcida adversária e os comentaristas não entenderam nada…




A CÚPULA DE CINGAPURA

Se não houver nenhuma surpresa – e isso sempre é possível em se tratando de Kim Jong-un e Donald Trump –, terça-feira, 12/6, às 9 horas locais, no Hotel Capella, em Cingapura, será realizada a aguardada reunião de cúpula entre os presidentes dos Estados Unidos e da Coreia do Norte.

O encontro é inédito, pois pela primeira vez vão se reunir presidentes desses países. Esse fato certamente será explorado por ambos como uma vitória. Trump poderá apresentar-se ao público como um estadista, capaz de negociar como nunca um presidente americano conseguiu. Kim Jong-un se fortalecerá perante os cidadãos de seu país como o líder que obrigou a superpotência a negociar. A vitória para ambos será ainda maior se for anunciada alguma ação concreta em favor da paz. Nesse aspecto, não se descarte a possibilidade da celebração de um tratado de paz entre as Coreias. Há notícias de que o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, estaria trabalhando nesse sentido e poderia juntar-se a Trump e Kim para fazer esse anúncio. Seria um grande troféu a ser exibido pelos três líderes e um significativo passo em favor da paz na Península Coreana.

Quando se concretizar, a formalização do fim da Guerra da Coreia, mais de 60 anos depois do fim dos combates, certamente será um acontecimento a ser comemorado. Será politicamente relevante e encerrará uma página triste da História, sendo um primeiro passo em direção da normalização da relação entre as Coreias e entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos. Infelizmente, contudo, terá pouquíssimo peso na solução definitiva da atual questão coreana.

Isso porque a chave do problema é a “desnuclearização” da Península Coreana. Essa é a exigência da comunidade internacional e será essa a cobrança que os Estados Unidos farão. Uma “completa, verificável e irreversível” desnuclearização. A Coreia do Norte dirá que também deseja uma península livre de armamento nuclear. Entretanto, para Kim Jong-un isso significa a retirada dos cerca de 24 mil soldados, a maior parte integrantes do 8.º Exército norte-americano, que estão na Coreia do Sul desde o fim das hostilidades, em 1953. Além disso, Kim exigirá o fim da ameaça de emprego de armamento nuclear pelos Estados Unidos.

Bem, sobre esse aspecto fundamental, a chance de um acordo é remotíssima. Em primeiro lugar, o próprio presidente da Coreia do Sul recentemente declarou que a presença de tropas americanas no país é resultado da aliança militar com os Estados Unidos e deverá ser mantida, mesmo com a celebração da paz. Jim Mattis, secretário de Defesa dos Estados Unidos, também declarou que a manutenção das tropas na Coreia do Sul é inegociável.

Neste ponto devemos lembrar que a Península Coreana não é o único foco de tensão na Ásia. Ao contrário. A atitude cada vez mais desafiadora da China, as tensões que envolvem as disputas territoriais no Mar do Sul da China, a questão de Taiwan, a rivalidade sino-japonesa, que envolve até mesmo disputas territoriais, tudo isso são fatores que exigem, do ponto de vista dos Estados Unidos, mais presença militar na região, não menos.

Além disso, uma menor presença militar norte-americana na área afetaria profundamente o Japão, que provavelmente se sentiria forçado a rever sua postura, modificar sua Constituição – chamada pacifista – e ampliar sensivelmente sua capacidade militar, trazendo ainda mais tensão à área.

A Coreia do Norte, por sua vez, alegará que a presença das tropas norte-americanas estacionadas no vizinho do sul são uma ameaça e que não pode abrir mão de seu armamento nuclear, que seria exclusivamente utilizado para a “autodefesa”. Assim, estará dado o motivo para não proceder a uma “completa, verificável e irreversível” desnuclearização.

Mas a pressão dos embargos econômicos é muito grande e o caos econômico poderia ter consequências graves para a sobrevivência do próprio regime. Em razão disso, muito provavelmente os norte-coreanos serão obrigados a fazer algumas concessões. Tentarão uma solução faseada, com a assunção de compromissos vagos, ao longo de anos, para ganhar tempo e obter o levantamento dos embargos e vantagens econômicas.

Não se pode tratar da questão coreana sem falar da China. País-chave na geopolítica asiática e fundamental para o encaminhamento da solução do caso, a China é a fiadora da estabilidade política e econômica da Coreia do Norte. Dessa forma evita um desastre humanitário de proporções enormes em suas fronteiras, ao mesmo tempo que contrabalança a influência norte-americana no nordeste da Ásia.

O governo chinês comemoraria um acordo selado na cúpula de Cingapura. Xi Jinping certamente trabalhou nesse sentido nas recentes reuniões que teve com Kim Jong-un, uma vez que isso iria ao encontro de seus interesses, pois contribuiria para a estabilidade político-econômica da Coreia do Norte e para o aumento da sensação de segurança na Coreia do Sul. A diminuição do temor de guerra entre os sul-coreanos contribuiria para uma gradual mudança da percepção dos cidadãos quanto à necessidade da presença das tropas norte-americanas em seu território. E a retirada das tropas dos Estados Unidos da Península Coreana seria uma vitória estratégica para a China.

Como se vê, não há muitas razões para otimismo. Mas pode-se esperar um acordo entre Donald Trump e Kim Jong-un que atenda, ainda que por diferentes motivos, aos objetivos de quase todos os países envolvidos ou interessados na solução do problema. E algum entendimento provavelmente virá. Não um definitivo, que resolva de vez a questão. Mas um que ao menos alivie as tensões e atenda aos interesses imediatos de todos os envolvidos. Que seja, ao menos, o muito esperado acordo de paz que porá um ponto final formal e definitivo na Guerra da Coreia.




ENCONTRO DE INTERESSES NA FRONTEIRA ENTRE AS COREIAS

O mundo assistiu à cena entre incrédulo e maravilhado. Um jovem chefe de Estado, risonho, corte de cabelo peculiar, caminha sabendo que a atenção de todo o mundo está voltada para ele naquele momento. Salta a demarcação da fronteira entre o seu país e o vizinho do sul, com o qual está formalmente em guerra há mais de 60 anos, e cumprimenta o sorridente presidente inimigo. Braços dados, convida o anfitrião a dar um passo em direção ao norte. Pronto. Agora ambos cruzaram o paralelo 38 norte e estão no país do jovem governante. Mais uma vez retornam ao sul e dão início à mais surpreendente visita de um chefe de Estado dos últimos tempos.

A visita foi realizada após a escalada da crise verificada nos últimos anos na Península Coreana. Os testes de mísseis intercontinentais e de armamentos nucleares realizados pela Coreia do Norte de forma sucessiva e aparentemente bem-sucedida foram duramente criticados pela comunidade internacional e pesadas sanções econômicas foram impostas ao país, até mesmo por seu maior aliado, a China.

Existem algumas regras gerais teóricas para a condução de uma crise. Deixar aberturas para o entendimento e saídas honrosas para os oponentes, procurar o apoio da opinião pública nacional e internacional e manter abertos os canais de diálogo são apenas alguns exemplos. Uma análise cuidadosa dos fatos que cercam o encontro entre os líderes da Coreia do Norte e da Coreia do Sul mostrará que esses princípios foram seguidos pelos principais atores internacionais envolvidos.

China, Estados Unidos e Coreia do Sul deixaram, embora não possam expressar isso claramente, uma saída honrosa para o jovem Kim Jong-un. Ele prometeu interromper os testes nucleares e desativar algumas instalações, mas em contrapartida, perante a opinião pública de seu próprio país, pôde apresentar-se como um líder forte e respeitado mundialmente, que é recebido com honras pelos principais chefes de Estado. Além disso, e mais importante, a posse do armamento nuclear, que, tudo indica, já foi suficientemente testado, não é de forma alguma ameaçada.

Vejamos os outros atores envolvidos. Comecemos pela China. É do interesse chinês a estabilidade do regime norte-coreano. Por questões pragmáticas, como evitar uma crise humanitária gigantesca e de reflexos imprevisíveis em suas fronteiras; e por motivações geopolíticas, para contrabalançar a influência norte-americana na Península Coreana. Entretanto, a Coreia do Norte é um aliado constrangedor para uma China que deseja apresentar-se ao mundo como um país moderno e responsável. Assim, não é agradável para os chineses terem de ficar se explicando sobre o apoio ostensivo ou velado ao regime norte-coreano. Em razão disso, desde 2017 a China vem se alinhando à comunidade internacional e impondo sanções comerciais mais duras à Coreia do Norte. No final de março, Kim Jong-un esteve em Pequim, em visita ao presidente Xi Jinping. É bastante provável que todos os passos seguintes, incluída essa visita à Coreia do Sul, tenham sido discutidos na ocasião.

O líder da Coreia do Sul, por sua vez, ganha muito. Moon Jae-In, que assumiu o governo após o impeachment da presidente Park Geun-hye, se fortalece perante a opinião pública de seu país e tem grandes possibilidades de passar para a História como o presidente que assinou a paz com a Coreia do Norte. Ao mesmo tempo, a população sul-coreana, cansada da tensão permanente, vislumbra a possibilidade de virar essa página triste da História e de implementar ações que possibilitem uma maior integração com seu vizinho do norte. Entretanto, é bastante improvável que haja qualquer modificação na aliança militar existente entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos.

Por falar em Estados Unidos, o presidente Donald Trump ganha muitos pontos. Capitaliza os resultados daquela reunião na distante Península Coreana como uma vitória pessoal. No Twitter comemorou os progressos e divulgou os preparativos para a reunião que terá, em breve, com o líder norte-coreano. Ora, para um líder bastante contestado, especialmente pela grande imprensa do seu país e da Europa, exibir um resultado como esse não deixa de ser surpreendente. Um acordo de paz que formalmente ponha fim à Guerra da Coreia, episódio marcante para a sociedade norte-americana, em que milhares de soldados perderam a vida, será uma grande vitória da administração Trump.

O ponto é que esse encontro entre os líderes das duas Coreias, um espetáculo midiático bem ensaiado, com direito a transmissão ao vivo para todo o mundo, atendeu aos anseios de todos os países envolvidos. Talvez acene com uma esperança de acordo de paz, o que não deixa de ser uma boa notícia. Mas dificilmente significará uma Península Coreana livre de armamento nuclear, ou uma distensão do regime ditatorial norte-coreano, ou a reunificação.

A Coreia do Norte fará promessas bem-intencionadas, que servirão de pretexto perfeito para o afrouxamento das sanções econômicas chinesas. Serão adotados novos procedimentos para que familiares separados pela guerra possam reencontrar-se, cruzando o tristemente famoso paralelo 38 norte. Donald Trump se reunirá com Kim Jong-un perante os olhos do mundo todo. Talvez seja celebrada a paz entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul. Não se vislumbra, entretanto, modificação relevante na presença militar norte-americana na península. Nem que a Coreia do Norte destrua seu arsenal nuclear. Nem que os chineses deixem de colaborar para a estabilidade do regime de Kim Jong-un.

O encontro na fronteira das Coreias não muda o fato de que hoje a paz possível naquela região é a paz armada, baseada na dissuasão militar, aos moldes da bastante conhecida guerra fria. Talvez não seja a paz ideal, mas ainda assim é infinitamente melhor do que a guerra.